Sorrisos, cigarros e memórias

Julhy Van Den Berg

Trago o cigarro na esperança de acalmar os ânimos da euforia que muitas vezes é confundida com a ansiedade, da felicidade de bons dias, e da tristeza dos dias cinzas que tanto me assustam.
Minha boca toca o filtro, puxa o fumo e meu peito relaxa, mas as lágrimas caem e me toco da importância de não coloca a nicotina no meu corpo, tarde demais. Fuçando as caixas de memórias, que minha mente guarda de uma maneira nada aprovada por Marie Kondo, meu peito acalma e todos os demônios se calam.
O ontem vai se repetir, amanhã vai passar e hoje é importante também.
É engraçado como tem memórias que pregam na gente, meu corpo ainda se arrepia inteiro toda vez que me recordo da voz rouca, do gemido que sai entre os lábios e caiam no meu ombro. Talvez eu precise iniciar a prática de abraçar, agradecer e deixar essa recordação ir, no entanto é gostosa demais pra largar.
Então eu beijo outro cigarro para descansar meus lábios do sorriso besta que minha boca não resiste em arreganhar, toda vez que topo com essas memórias no início, meio ou fim do dia.

Visitando o quarto antigo

Julhy Van Den Berg

Muitas vezes me pego retornando pro antigo quarto escuro, onde tudo era gritaria e tinha o sabor amargo que não era do meu café quente pela manhã. Esse gosto eu conhecia, estava carregado de dor. Meu peito acelerava, as lágrimas que rolavam dos meus olhos caiam pelo meu rosto lavando todos os meus poros. Me recordava do desejo de morrer.

Mas hoje, ao retornar para esse quarto, vejo uma fresta de luz, que vem de fora. Quem habitou ele antes, deixou um furo no telhado, recados nas paredes e um guia de como não chegar ao limite novamente.

Egoísmo está escrito em diversos idiomas.

Selfishness, égoïsme, эгоистичность, egoísmo.

Tudo para não me fazer esquecer desse sentimento tão importante e que me impede de doar tudo o que tenho e não tenho para quem chega na minha porta.

Pra quem entra e sai de mãos cheias ou nem tanto assim. Cansei de dar tudo e ao fim, ficar vazia. Seca ao ponto de tomar muito mais daquilo que dei, esgotar os que amo e muitas vezes precisam tanto quanto eu. É triste, doloroso e letal para qualquer sentimento bom que exista dentro de mim.

O quarto possui lágrimas, mas não é tão assustador como já foi um dia. Ele tem lembranças, nem todas são boas. E as lágrimas que correm hoje pela minha face vão contando histórias muito semelhantes a atualidade, meu desespero, mas depois o ar que me fugiu, voltar a preencher o meu peito.

Tudo vai melhorar. Sempre melhora.

A chegada

Julhy Van Den Berg

    “E nas ruas da cidade tinha a gente ali, caminhando juntas”.
É assim nos meus sonhos e na lembrança de você indo me deixar no metrô, aquele dia eu queria ter ficado mais, porém não vou me arrepender de ter ido embora.
Ir me fez ver o quanto eu queria voltar correndo, o reencontro foi ainda mais gostoso que o outro dia, cheio de medo, nervoso e curiosidade. A vontade de dizer “eu te amo”.
O meu peito estava vazio, você chegou entrando com tudo, meteu o pé na porta e me preencheu, de amor.
Sigo na saudade que só aumenta e vai tomando conta de mim, dia após dia, desde o dia que eu te disse “até logo”.
Obrigada por ter chegado.

Oi, como vai a vida?

Julhy Van Den Berg

A vida hoje tem cheirinho de café pela casa, pernas pra cima, dança estranha, banho longo, soninho da tarde, noite e manhã.
A vida hoje tem um gosto, que não é aquele amargo, é doce, salgado, cítrico.
Tem cerveja na geladeira.
Tem um peito relaxado, uma respiração mais calma.
Tem amor acordando na cama, no banho e na cozinha fazendo comidinha.
Tem amigo batendo na porta, carregando sorriso no rosto e abraço apertado.
Tem eu.
A vida hoje tem muita felicidade.